Plásticos Biodegradáveis Fake: a natureza não agradece

Por Ítalo B. Castro e Paula C. Jimenez (*)

Nas últimas décadas, a quantidade de detritos plásticos em ambientes naturais tem aumentado de forma drástica, gerando impactos significativos sobre os ecossistemas costeiros, marinhos e terrestres. Paralelamente, os avanços científicos recentes atestam que a produção, uso e descarte de utensílios plásticos representam ameaças maciças ao bem-estar humano e ambiental, praticamente na mesma proporção das mudanças climáticas. De fato, o problema do plástico tem despertado a preocupação tanto de agências ambientais (nacionais e internacionais) como de gestores(as) públicos(as) que, visando amortizar o problema, vêm adotando medidas regulatórias. Embora ações para reduzir o problema ambiental dos plásticos sejam bem-vindas, muitas decisões recentes têm sido tomadas sem a necessária ponderação de especialistas sobre o tema.

No último 7 de junho, o site da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) divulgou matéria informando que, a partir do segundo semestre, as escolas estaduais irão substituir os copos de plástico comum por outros de material biodegradável. A matéria, intitulada Governo de SP vai extinguir o uso de copos e material plástico nas escolas estaduais, ainda menciona que os utensílios substitutos serão confeccionados em polipropileno biodegradável e que a fabricação do produto é feita de acordo com supostas resoluções vigentes da Anvisa.

À primeira vista, essa pode parecer uma medida nobre e acertada, porém existem dois aspectos importantes a serem analisados na matéria: primeiro, polipropileno biodegradável não existe, e, segundo, a Anvisa regula apenas aspectos ligados à saúde pública (nesse caso, quanto à composição e utilização desses materiais), não sendo de sua competência a avaliação de critérios ecológicos dessa vereda, como a biodegradabilidade dos materiais.

Embora a matéria não forneça maiores detalhes, as informações veiculadas levam a crer que os novos utensílios a serem usados nas escolas serão feitos de plásticos oxo-biodegradáveis que, apesar da nomenclatura, não sofrem degradação em ambientes naturais e ainda podem acelerar a formação de microplásticos. Esses materiais já foram proibidos em vários países do mundo, inclusive na União Europeia, devido aos riscos ambientais e ao seu enquadramento como prática de greenwashing (termo em inglês que indica falsas alegações ambientais em produtos comerciais). Nesse aspecto, a Fundação Ellen MacArthur publicou uma declaração pedindo a proibição mundial de plásticos oxo-degradáveis e já recebeu a adesão 150 organizações, incluindo European Bioplastics, M&S, PepsiCo, Unilever, Veolia, British Plastics Federation, Gulf Petrochemicals, WWF e dez membros do parlamento europeu. Portanto, a substituição propagandeada pela Secretaria de Educação é, potencialmente, mais lesiva para a natureza do que os plásticos convencionais atualmente utilizados.

No Brasil, não é crime produzir, comercializar e utilizar utensílios feitos com materiais oxo-biodegradáveis, os quais podem ser facilmente encontrados nas gôndolas da maioria dos supermercados, vendidos sob falsas alegações de biodegradabilidade. Por outro lado, quando um produto reconhecidamente prejudicial para o meio ambiente passa a ser adotado como alternativa sustentável por intuições públicas, sobremaneira em escolas estaduais, é importante que explicações sejam requisitadas. Cabe ainda enfatizar que o Brasil é o quarto maior gerador de resíduos plásticos do mundo, sendo essencial que políticas públicas cientificamente orientadas sejam implementadas. Mais além, a leniência com que temos encarado essas questões pode levar consumidores(as) conscientes a abandonar práticas ambientalmente amigáveis, reduzindo sua disponibilidade em consumir produtos que sejam realmente biodegradáveis.

Na maioria das nações desenvolvidas do mundo, substituições como a proposta pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo têm sido feita por utensílios descartáveis que sejam, de fato, biodegradáveis, como aqueles feitos de papel, papelão ou madeira. Alternativamente, e ainda mais desejável, seria empregar o recurso disponibilizado e adotar materiais reutilizáveis que reduzem substancialmente a geração de resíduos e, simultaneamente, ajudam a educar as crianças com relação às responsabilidades com seu próprio lixo. De todo modo, para avaliar se essa é uma medida ecologicamente sã, é essencial que o Governo do Estado indique publicamente qual é o tipo de material que será utilizado na referida troca, demonstrando, assim, que a entidade construiu um repertório técnico robusto nesse assunto para apoiar, com propriedade e responsabilidade, a hashtag #CombataAPoluiçãoPlástica.

(*) Ítalo B. Castro e Paula C. Jimenez são pesquisadores do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (IMar/Unifesp)

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